Contexto histórico do Trovadorismo
Na postagem anterior destacamos o Trovadorismo e o seu contexto histórico, dominado pelo teocentrismo e pelo feudalismo.
Falamos também sobre o Trovadorismo em Portugal. Vamos agora tratar das
cantigas trovadorescas e seus autores mais importantes.
A requintada
população da Provença caracterizava-se pelos ideais de vida burguesa,
procurando viver de modo mais ameno possível, sem mesmo se notar uma diferença
marcante entre o fidalgo e o burguês. Para tanto, contribuíam a divisão
racional da propriedade e o afrouxamento dos laços de dependência feudal, o que
propiciava o aparecimento de forte individualismo, significando isso, na Idade
Média, um choque com os princípios da Igreja, pois representava uma concepção
de vida oposta às doutrinas ortodoxas. Ademais, vale ajuntar que o clero, no
Sul, não possuía a mesma força dos religiosos do Norte, pois estava submetido
aos senhores feudais. Audemaro Taranto Goulart e Oscar Vieira da Silva.
Cantigas trovadorescas
Cantiga
trovadoresca é a denominação concedida aos textos poéticos da primeira época
medieval e que fizeram parte do movimento literário do Trovadorismo.
Em geral, eram músicas cantadas em coro e, por isso, receberam o nome de cantigas.
A poesia
trovadoresca possui uma tendência lírico-amorosa e outra satírica.
Na primeira, predominam os temas do sofrimento amoroso e da saudade. Na
segunda, são feitas críticas a pessoas ou costumes, algo bastante ousado em uma
época de repressão ao livre pensamento.
Cantigas líricas
Vimos na
postagem Gêneros literários e escolas literárias que o
termo lírico recebeu esse nome, pela referência à lira,
instrumento musical que acompanhava a declamação de poesias na antiguidade.
Inclui os textos poéticos de caráter sentimental que revelam as emoções do
autor. É caracterizado pela função poética da linguagem e pelo uso de palavras
no seu sentido conotativo (sentido dado a uma palavra em função
de seu contexto, que não corresponde ao seu significado literal) com
predominância da primeira pessoa do singular (eu).
São textos
breves porque não apresentam enredo e sim a exteriorização do mundo interior do
poeta, o eu lírico, também chamado de sujeito lírico ou eu
poético, não se refere ao autor do texto (pessoa real) por ser uma entidade
fictícia (feminina ou masculina). É uma criação do poeta, que faz o papel de
narrador ou enunciador do poema. O eu lírico representa
a "voz da poesia".
As cantigas
líricas possuem dois ramos, as cantigas de amor, cujo tema é o
sofrimento amoroso, e as cantigas de amigo, que cantam
a saudade do ser amado. Vamos a elas!
Cantigas de amor
São escritas
na primeira pessoa do singular (eu). Nelas, o eu poético,
ou seja, o sujeito fictício que dá voz à poesia, declara seu
amor a uma dama, tendo como pano de fundo o formalismo do ambiente palaciano. A
confissão amorosa é direta e o trovador comumente se dirige a ela, chamando-a
de “mia senhor” ou “mia senhor fremosa” (minha
senhora ou minha formosa senhora). O apaixonado,
geralmente acometido pela coita, a dor amorosa diante da
indiferença da amada, é servo e vassalo de
sua adorada e expressa seu amor com insistência e intensidade.
As cantigas de amor surgiram entre os séculos XI e XIII, influenciadas pela
arte desenvolvida na região da Provença, no sul da França. A influência do
lirismo provençal foi intensificada com a chegada de colonos franceses na
Península Ibérica e que foram lutaram contra os mouros (árabes)
ligados à Provença. Destaca-se também o intenso comércio entre a França e a
região ocidental da Península Ibérica, alcançando o Atlântico Norte.
Nesse contexto, surge o "amor
cortês", baseado num amor impossível, onde os homens sofrem de amor por
desejarem mulheres da corte, geralmente casadas com nobres. Essa concepção é
mais intensa na voz dos trovadores de Portugal e da Galiza (comunidade autônoma
espanhola situada no noroeste da península Ibérica, onde antigamente se situou
a Galécia e o Reino da Galiza). Esses trovadores não se limitam a imitar, mas a
"sofrer de maneira mais dolorida".
Como, você pode estar se perguntando,
o trovador assumia essa posição de submissão diante da mulher se na Idade
Média, a mulher ainda ocupava um lugar inferior na escala social? A resposta é
dada pelos estudiosos da Literatura Audemaro Taranto Goulart e Oscar Viera da
Silva:
No Sul da França (Provença), entretanto, a situação da mulher era diferente (da situação da mulher do Norte da França): a lei lhe conferia igualdade jurídica com o homem, evidenciada no fato de ela herdar, possuir bens, e poder, depois de casada, dispor deles sem que fosse necessário o consentimento do marido. Como se vê, a nova civilização possuía um ideal feminista, que vai ser representado nas Cantigas de Amor pela sujeição amorosa do homem, pela submissão imposta pelo desejo e imposição femininos.
Cantigas de amigo
São escritas na primeira pessoa do singular (eu) e, geralmente, são apresentadas em forma de diálogo. O trabalho formal é mais apurado em relação às cantigas de amor. Originam-se do sentimento popular e na própria Península Ibérica.
Nelas, o eu poético é feminino, mas
seus autores são homens. É a dama quem expõe seus sentimentos, sempre de
maneira discreta porque, no contexto provençal, o valor mais importante de uma
mulher é a discrição. A donzela dirige-se por vezes à sua mãe, a uma irmã ou
amiga, ou ainda a um pastor ou alguém que encontre pelo caminho.
Cantigas satíricas
Apresentam, em geral, uma crítica
indireta e irônica. Costumam ironizar ou difamar determinada pessoa. Demonstram
também a ousadia do trovador ao criticar a sociedade da época, em que o livre
pensamento era combatido pela Igreja. São dois os tipos de cantigas satíricas:
as de escárnio e as de maldizer.
Cantigas de escárnio
São mais irônicas e trabalham sobretudo com trocadilhos e palavras de duplo sentido, sem mencionar diretamente nomes. São críticas indiretas: é um “mal dizer” de maneira encoberta, insinuada.
Cantigas de maldizer
São aquelas em que os trovadores apontam direta e nominalmente o alvo de suas sátiras, de forma propositalmente ofensiva e fazendo uso de termos de baixo calão, como palavrões, pois o intuito é mesmo agredir alguém verbalmente.
Principais autores do trovadorismo
Portugal
O rei D. Dinis (1261-1325) foi um
grande incentivador que prestigiou a produção poética em sua corte. Foi ele
próprio um dos mais talentosos trovadores medievais com uma produção de 140
cantigas líricas e satíricas.
Paio Soares Taveirós – foi um trovador
da primeira metade do século XIII. Vinha de origem nobre, é autor da Cantiga de
Amor A Ribeirinha que é considerada a primeira obra em língua galaico –
portuguesa.
João Soares Paiva, João Garcia de Guilhade , Fernão Rodrigues de Calheiros , Pero Gonçalves Portocarreiro.
Espanha
D. Afonso X – considerado o grande renovador da cultura peninsular na segunda metade do século XIII. O mesmo escreveu um grande número de composições em galaico-português que ficaram conhecidas como Cantigas de Santa Maria.
Martim Codax, Nuno Fernandes Torneol, Paio Gomes Charinho.
França
Arnaut Daniel, Bernart de Ventadorn, Guilhem de Peitieu e Raimbaut d’Aurenga.
O assunto da próxima postagem será o Humanismo.
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